25 de fev. de 2008

A Filosofia de um Sapateiro


Foi em um desses eventos para executivos, sobre planejamento estratégico que encontrei um antigo vizinho e que me fez lembrar do Sr. Luigi Bianco.

Gigio – era assim que todos nós o chamávamos - era um sapateiro no bairro do Brás em um tempo que já faz parte da história, quando, por lá, falava-se meio cantado, influência da forte imigração italiana.

O velho Gigio, não tão velho – não passava dos quarenta – embora, para nós, meninos de doze e treze anos que jogávamos bola na rua, ele era um senhor - tinha a simpatia e o respeito de toda a vizinhança: além de ser um bom sapateiro, era solidário e prestativo com todos, na alegria e na tristeza, sempre pronto a ajudar, além de suas falas filosóficas que narrava tão bem à sua platéia: seus fregueses que ficavam por ali enquanto ele dava uma “manutenção” em seus pares de sapato.

Ninguém como ele colocava tão bem uma meia-sola, os sapatos saíam como novos de sua oficina! Ele realmente gostava da sua profissão.

Foi uma de suas falas que me fez lembrar do bom artesão: estava eu em sua sapataria com ele a costurar uma bola de capotão – ia ter “jogo contra” e a “redonda” tinha que estar em forma! – quando chega o filho da Dna. Maria do 21, com um par de sapatos, o único que ele tinha, para arrumar. O menino, mais velho do que eu, estava com um ar não sei se de preocupado ou assustado e o Gigio também notou, tanto que foi logo perguntando:

- Hei, paisà! Qual é o problema? Porquê esta cara de choro?
– responde o menino: É “seu” Gigio, fui fazer um teste lá na Matarazzo do Belenzinho e fui reprovado, vou ter que continuar trabalhando na venda do senhor Adiz. Emprego como aquele não se encontra todo dia...
- “Bella Roba” – respondeu-lhe o sapateiro – Se perdeu a oportunidade de arrumar um novo emprego hoje, amanhã arruma outro igual ou melhor! – e continuou ele – Emprego é como sapato: você tem que escolher bem, não é só o modelo que importa, precisa calçar de acordo com o seu pé, se a firma tem uma imagem pra fora bonita, mas com um ambiente de trabalho schifoso é como sapato da moda que aperta os dedos do pé: todo mundo admira, mas você sofre um bocado para andar e não vê a hora de chegar em casa para se livrar dele. Agora, se o sapato for largo, também não é bom, é como um emprego honesto como você tem hoje e que não dá muita importância e não se dedica o necessário – cuidado! Um dia o sapato sai do seu pé e você perde algo que só vai perceber a falta quando não tiver mais.

- Por isso, caro amigo, encontrando um emprego, não importa se é em uma grande companhia ou se vai lhe pagar um rio de dinheiro, o que importa é se o que você faz lhe agrada e o ambiente seja bom, que haja vida! Neste caso, use sapatos com cadarços e amarre bem eles, e sinta o seu caminhar firme e pra frente. Este vale a pena segurar!

Claro que a gente fica triste, pois emprego é uma segurança, segurança da sua cabeça que você hoje não vai entender, mas, mais tarde, vai saber que a coisa mais importante desta vida é a sua própria vida, é fazer o que se gosta, a felicidade é só sua, de ninguém mais. Por isso, tira esse ar de tristeza da cara e avanti... a vida tem muito para lhe oferecer e o trabalho é uma dessas coisas, mas, lembra, não é tudo! O par de sapatos é importante para proteger os pés, mas você nasceu sem eles.

Muito tempo já se passou! O jovem preocupado em nossa história, que, por coincidência, encontrei naquele evento sobre planejamento estratégico, ocupa hoje uma posição de diretor financeiro em uma grande empresa e continua com aquele olhar triste. Quase lhe perguntei sobre os seus sapatos...

Hoje não existe mais bola de capotão, muito menos sapatos que recebem meia-sola, tanto a bola como os sapatos são produtos descartáveis.

E os empregos? Estes se diversificaram um bocado! Poucos ganham muito e muitos procuram uma oportunidade em um mercado cada vez mais técnico e competitivo. Tem-se que andar muito, gastar muita sola de sapato para encontrar, nem sempre, um emprego que se ajuste à nossa satisfação. Mas, é bom lembrar: o novo par de sapatos não precisa estar na moda e nem custar um dinheirão. Como diria o velho Gigio com seu sotaque romano: O importante é ser honesto e ter um emprego decente – Bons tempos aqueles...

E você, anda com os seus sapatos firmes? Não esqueça de lhe dar uma manutenção, uma engraxada de vez em quanto, para preservar o couro e ele lhe responder de forma macia ao seu pisar. Agora, se eles estão lhe apertando os pés, dê um jeito de trocá-los e se não for possível, procure amolecer o couro, consulte um velho sapateiro para ajudá-lo ou, caso contrário, você continuará a sofrer, mas mantendo as aparências!

“Bella Roba!”

Por: Luiz Carlos Hummel Pires

Consultor Señor do Grupo Executives

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